Proposta de correção do Manual – Expressões – Porto
Editora – p. 302
1.1.
A
modificação do provérbio serve ao narrador para recordar a promessa de D. João
V, exigível mesmo depois da morte do franciscano a quem a fizera. A transformação
do adágio popular evidencia a sua dimensão moralizadora, destacando a
necessidade de cumpri- mento de compromissos estabelecidos.
2.
D.
João V escolhe o Alto da Vela por lhe parecer um local fértil, rico em água e
próximo do mar.
3.
As
formas verbais “sosseguemos” (l. 5), “Haveremos” (l. 6) e “Oremos”
(l. 11) denotam a inclusão do narrador no uni- verso diegético, fazendo-se
parte do grupo de personagens que aguardam o cumprimento da promessa do rei.
Deste modo, confere ao discurso maior credibilidade. O termo “Oremos” remete
para o discurso religioso, pelo que adquire, no contexto, um tom irónico.
4.
As
formas verbais estão conjugadas no pretérito mais-que-perfeito do indicativo,
uma vez que referenciam ações concretizadas antes do presente da narrativa, ou
seja, anteriores à visita do padre Bartolomeu à abegoaria.
5.
Sendo
uma “multidão” um grande número de pessoas, algumas “centenas” configuram,
obviamente, uma multidão. A ironia do narrador encerra uma crítica à
historiografia oficial, que omite habitual- mente as massas anónimas. Ao
colocar em evidência o grupo de operários do convento, o narrador
deliberadamente refere o seu número, como forma de destacar o seu esforço e a
sua valentia, geralmente ignorados.
6.
O
padre Bartolomeu estranhou a quantidade de pessoas no local e também o facto de
se movimentarem agitadamente ao som de uma “trombeta” (ll. 39 e 41).
Pela semelhança de ambiente, considerou estar diante de uma festa ou em cenário
de guerra.
7.
Com
o recurso à repetição do nome “homens” e a vocábulos que reenviam para a
sua quantidade, o narrador confirma a ideia de que se tratava de uma “multidão”
de trabalhadores.
8.
A
aproximação dos homens às formigas evidencia quer a quantidade de operários,
quer a organização e a rapidez dos trabalhos. Conhecidas pela sua natureza
laboriosa, as formigas servem de termo de comparação com os homens, igualmente
dedicados a um trabalho coletivo. Contudo, o comentário final do narrador
evidencia a diferença existente entre os dois grupos ao nível do proveito:
apesar de o esforço de ambos terminar “num buraco” (l. 49), ele
representa a alimentação e a vida das formigas, ao passo que corresponde à
morte, física ou na memória histórica, dos homens.
9.1.
Narrador
heterodiegético: “El-rei foi a Mafra escolher o sítio onde há de ser
levantado o convento.” (l. 7); Narrador homodiegético: “porém
sosseguemos, a pobre não emprestes, a rico não devas, a frade não prometas, e
D. João V é rei de palavra. Haveremos convento.” (ll. 5-6);
Narrador
reflexivo e descritivo: “um homem pode ser grande voador, mas é-lhe muito
conveniente que saia bacharel, licenciado e doutor, e então, ainda que não voe,
o consideram.” (ll. 13-15); “estava a abegoaria em abandono, dispersos
pelo chão os materiais que não valera a pena arrumar, ninguém adivinharia o que
ali se andara perpetrando.” (ll. 17-20);
Narrador
sentenciador e moraliza- dor: “Nem sempre se pode ter tudo” (l. 1); “a
pobre não emprestes, a rico não devas, a frade não prometas” (ll. 5-6);
Narrador crítico e irónico: “com todas as disposições, licenças e
matriculações necessárias, partiu o padre Bartolomeu Lourenço para Coimbra” (ll.
25-28); Narrador gestor omnisciente da matéria histórica e ficcional: “Haveremos
convento.” (l. 6); “Até à vila de Mafra, aonde primeiro vai, não tem a
viagem história, salvo a das pessoas que por estes lugares moram” (ll. 29-32).
10.
A
ação decorre entre a quinta de S. Sebastião da Pedreira e o Alto da Vela (onde
D. João V se encontra no início do excerto e onde o padre Bartolomeu encontra,
anos volvidos, os trabalhadores do convento). O primeiro local associa-se
simbolicamente à construção da passa- rola, sendo, por isso, conotado com a
ideia de sonho e de concretização. O segundo, igualmente espaço de construção,
representa o carácter disfórico dessa atividade, assente na exploração dos
trabalhadores e associando-se aos valores negativos do sacrifício e da
dor/morte.
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